Não sei bem como começar este texto. Ultimamente estou com grande dificuldade em organizar as palavras que saem de minha mente. Mesmo assim, corri para cá escrever sobre algo que acabara de ocorrer, algo diferente, algo que há tempos não acontecia.

Fui abordado por um senhor na plataforma do trem, na estação São Caetano. Um senhor que aparentava uns 60 anos, com roupas comuns, calças jeans e camiseta. Com seus óculos e olhar profundo me encarou ao ponto de eu tirar os fones de ouvido. Notando minha ação receptiva, afirmou: “Vou te fazer uma pergunta! Uma pergunta para gente jovem!”

  • Fale lá - respondi com um sorriso.

  • Se você tivesse uma passagem na mão neste momento, para a onde ela te levaria?!

Respondi de maneira rápida e assertiva: “Para minha cidade, Presidente Prudente.”

Notei um olhar pensativo, quase que duvidando de minha resposta. Talvez esperasse uma resposta diferente, acredito.

  • Sinal que você pensa com o coração, não com a razão. Que bom! Normalmente durante a juventude não é assim. Jovens têm anseio por conquistar o mundo, conhecer inúmeros países e lugares de tudo que é canto!

  • Não eu! - Afirmei

Então ele começou a contar de sua trajetória. Que quando jovem, deixou sua minha família lá em São José do Rio Preto e foi atrás de seu sonho, vindo ser programador em São Paulo na década de 80. Cursou economia e depois fez pós graduação na FEA.

  • Me colocaram tanta bobagem na cabeça, tantas e tantas coisas que eu deveria saber para ter sucesso na carreira. Mas me diga, você quer ter uma chácara ou sítio? Por isso quer voltar para lá? - Me perguntou com um olhar investigativo mas com certa alegria.

  • Algo do tipo! Eu e minha esposa queremos ter uma casa sustentável. Estamos casados há três anos e neste tempo passamos por muitas mudanças. Nosso maior desejo é voltar para lá, perto de nossa família.

Por um momento no meio dessa conversa me questionei quando fora a última vez que conversei assim com alguém. Qual foi a última vez que não tive medo ou vergonha de dizer realmente o que penso esperando um julgamento alheio. Talvez por ser uma pessoa totalmente estranha e de improvável reencontro, seja mais fácil ter este tipo de diálogo.

Ele continuou contando sobre alguns evento de sua vida, hoje entende que as coisas mudaram muito! Principalmente na maneira com que as pessoas se relacionam, alegando que não existe mais amor. Neste momento fiz um comentário:

  • Acredito que a gente não se surpreende mais com certas coisas, e isso me assusta um pouco.

  • Pois quem me deixou surpreso foi você! Ousei falar contigo! É a primeira vez que faço isso. Não imaginava que fosse me dar atenção. Vamos nos falando até o final da linha. E digo mais! Vou ser ousado mais vezes.

  • Infelizmente eu desço na próxima estação. Mas foi um prazer ter essa conversa. Você disse coisas que eu vivo me questionando, sem saber que caminho seguir. Obrigado.

  • Ah, que pena! Só para fechar isso aqui então. A única coisa que te desejo é a felicidade. Que você seja muito feliz. E lembre-se que só o presente importa, não deixe nada para depois. Depois não haverá mais tempo. Não se esqueça.

Subi as escadas da estação com um sentimento incrivelmente bom. Como uma pessoa totalmente desconhecida e aleatória pode transformar nosso dia?! Confesso que por alguns instantes não sabia se tudo aquilo era real. Será que outras pessoas viram o que aconteceu? Será que eu devo chegar em casa e arrumar as malas? Avisar o pessoal do escritório que não vou mais? O que realmente deveria estar fazendo hoje, agora?

Enfim, a ousadia de uma pessoa tornou meu dia muito mais alegre. De uma forma ou de outra, acredito que durante minha vida permiti certa vulnerabilidade à este tipo de evento, seja dádiva ou calamidade. O que será que vem a seguir?